Por Marilinda Marques Fernandes
Nossa abordagem será essencialmente no campo da proteção jurídica ao portador de lesões por esforços repetitivos.
As doenças, principalmente as incuráveis, sempre foram objeto de preconceito social contra os portadores das mesmas. Assim, se a pessoa era portadora de uma determinada doença que a incapacitava, era marginalizada da sociedade e excluída do mercado de trabalho. Tanto mais que, no que concerne às relações de trabalho, estas eram regidas pelo direito civil, sendo que as doenças que vitimavam o trabalhador eram tomadas como causas dissolutivas ou suspensivas do contrato de locação de serviços. Com o surgimento do Direito do Trabalho as enfermidades deixaram de se constituir em forma de descumprimento de obrigação, procurando-se, com o novo regramento, garantir o emprego e o salário do trabalhador por via da previdência social.
Acontece que a nova ordem jurídica, protetiva do emprego e do salário do trabalhador doente, não consegue evitar que este sofra com o preconceito e a discriminação no ambiente de trabalho. No caso da LER/DORT, doença do trabalho adquirida em face das condições especiais em que o trabalho é realizado trazem para o trabalhador acometido pela mesma grande sofrimento pela dificuldade em serem ouvidas suas queixas que, se atendidas em devido tempo, poderiam resultar em diagnóstico inicial, ou em práticas preventivas e curativas, sob orientação de um tratamento adequado. Mas o mais comum é a empresa negar a situação insinuando que o empregado está simulando os sintomas ou que estes não tem relação com o trabalho realizado.
Desta feita o trabalhador acometido por LER/DORT se vê vitima de discriminação ao ser submetido a tratamento desigual no ambiente de trabalho em virtude de ser visto, de início, como dissimulador, mais tarde, como improdutivo e, muita vezes, como culpado em desenvolver a doença. A empresa por seu turno procura desviar a questão de suas verdadeiras causas e, dessa forma, a gênese da doença se encontra no modo como se organiza o trabalho, ou seja, decorre das condições especiais em que o trabalho é realizado.
Uma vez afastado para tratamento, o portador de LER sofre na busca dos benefícios previdenciários, vinculados estes ao estabelecimento do nexo causal e à verificação da incapacidade para o trabalho.
Constatada a doença, deverá o empregador emitir a CAT – Comunicação Acidente do Trabalho, encaminhando, desse modo, o trabalhador lesionado ao INSS. Nos termos do artigo 23 da Lei 8.213/91 considera-se, em caso de doença do trabalho, como dia do acidente, o dia em que for realizado o diagnóstico.
Uma vez enquadrado na previsão do artigo 20 da lei 8.213/91, a qual considera como acidente do trabalho as doenças do trabalho, o portador de LER/DORT, se em tratamento, passa a ter direito ao auxílio doença acidentário, o qual tem seu valor calculado em 91% do salário de benefício, sendo que este é calculado em cima da média aritmética simples dos maiores salários de contribuição correspondentes a oitenta por cento de todo o período contributivo.
Se ao cabo do tratamento restarem sequelas incapacitantes o portador de LER/DORT tem direito à reabilitação nos termos do artigo 89 da lei 8.213/91 e, em caso de ficar parcialmente incapaz, tem direito ao auxílio acidente no valor de 50% do salário de benefício.
Este benefício, na data de qualquer aposentadoria, incorpora a base de cálculo do salário de benefício até ao teto.
Se o portador de LER/DORT ficar totalmente incapaz e sem possibilidade de recuperação tem direito à aposentadoria por invalidez acidentária, sendo que atualmente o valor da mesma é igual às demais aposentadorias por invalidez, a saber, 100% do salário de benefício.
Por outro lado, em razão do artigo 118 da lei 8.213/91, o trabalhador acidentado tem garantida a estabilidade no trabalho por 12 meses a contar da data da alta do auxílio doença acidentário.
O empregado portador de LER/DORT tem assim garantida a estabilidade provisória do emprego inclusive nos casos em que o auxílio-doença é concedido no curso do aviso prévio, mesmo indenizado, vez que esse integra o contrato de trabalho para todos efeitos.
No caso em que haja transcorrido o período de estabilidade provisória sem que o trabalhador o tenha aproveitado, converte-se o direito à reintegração em indenização pecuniária, equivalente ao pagamento dos salários desde a data da despedida até o final do período de estabilidade.
Além da reparação por via do Seguro Acidente do Trabalho a cargo da Previdência Social, o trabalhador tem direito a uma indenização a cargo do empregador, oriunda de acidente do trabalho, decorrente de dolo ou culpa, prevista no inc. XXVIII do art.7º da CF.
O pagamento das prestações por acidente de trabalho pela Previdência Social não exclui a responsabilidade civil da empresa ou outrem. À responsabilidade civil do empregador pelo infortúnio laboral são aplicadas as regras do direito civil. O art.186 do Código Civil dispõe:
Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que moral, comete ato ilícito.
O dever indenizatório por perdas está previsto no art.927 do Código Civil:
Aquele que, por ato ilícito (arts.186 e 187), causar dano a outrem é obrigado a repará-lo.
A indenização está disciplinada nos arts. 944 e seguintes do CC. Ela se mede pela extensão do dano (art.944).
Para a caraterização da responsabilidade subjetiva é imperiosa a existência do dano (prejuízo a bens morais e/ou materiais), do dolo ou da culpa do agente, que pode ter caráter omissivo ou comissivo, e do nexo de causalidade entre os dois primeiros.
O risco do acidente de trabalho muitas vezes é inevitável, entretanto, deverá ser prevenido. Aí é que reside a responsabilidade do empregador: proteger o empregado a fim de prevenir situações de perigo. É seu dever legal observar as normas de segurança, higiene e saúde no trabalho. A inobservância de norma de conduta, com resultado danoso ao empregado, cujo empregador tem o dever de conhecer e observar, traz consequências no âmbito da responsabilidade civil.
O novo Código Civil inovou na matéria estabelecendo a responsabilidade objetiva e em seu art.927 prevê que:
Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.
A indenização por dano moral está assegurada na Constituição Federal – art.5º, inc. X (São invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação).
O dano moral decorrente de acidente de trabalho baseia-se no grau de sofrimento intrínseco do trabalhador ou de seus familiares. Não há parâmetro objetivamente construído para sua avaliação. Ela deve levar em conta a extensão do dano – repercussão em relação ao ofendido e a seu meio social – grau de dolo e de culpa do lesante, a duração da ofensa e as condições econômicas de ambas as partes.
Os danos materiais e físicos estão relacionados com a perda da capacidade de trabalho: total, parcial, temporária ou permanente. O dano material está relacionado à perda do direito ao trabalho, enquanto o físico se baseia na perda das funções físicas.
O ressarcimento é realizado por um valor fixo ou por meio de pensão mensal.
Abordamos, assim, de modo sucinto os principais instrumentos legais que se colocam à disposição do trabalhador lesionado por LER/DORT, sendo que, não devemos esquecer que o mais importante é a prevenção e a organização por local de trabalho, de modo a evitar os caminhos da reparação.
Porto Alegre, 15 de janeiro de 2016
Marilinda Marques Fernandes*
(Resumo da palestra proferida no ano passado em painel sobre os lesionados por LER/DORT, organizado pelo Dr. Antonio Jane Cardoso)
Advogada especializada em Direito da Seguridade Social. Assessora jurídica do SINDISPREV/RS