Na última semana, dia 23 de novembro, ocorreu o XX Encontro Estadual do Núcleo de Aposentados e Pensionistas do Sintrajufe/RS (NAF), evento que contou com palestra da Dra. Marilinda Marques Fernandes a respeito dos impactos da atual proposta de reforma da Previdência, a PEC 287.
O presidente do sindicato, Cristiano Moreira, abriu o encontro falando sobre as mobilizações que o sindicato integrou desde o início da gestão, assim como as demandas atuais e as ações que o Sintrajufe tem em mente. “O governo omite os ataques do setor privado com a reforma da Previdência e chama os servidores de privilegiados. Temos que ter resistência ao governo que ataca trabalhador. Estamos nos organizando com outros sindicatos para marchar em Brasília. O Fórum de Defesa da Previdência tem dezenas de entidades do funcionalismo e privadas e irá enfrentar os ataques, como fez no passado, entrando com ação contra a propaganda publicitária do governo para aprovar a reforma da Previdência”.
Ruy Almeida, coordenador do departamento jurídico do sindicato, apresentou o novo escritório de advocacia contratado e a novas ações que pretendem promover, principalmente contra propaganda do governo sobre reforma da Previdência. “O governo não pode utilizar verba pública para divulgar projeto de lei, somente na última campanha gastou 9o milhões, apenas utilizando como argumento para o deficit previdenciário a falácia de que os servidores públicos ganham muito, trabalham pouco e querem se aposentar muito cedo”, argumentou Ruy. Também pretendem entrar com ação contra a MP 805, que mexe com o reajuste do salário dos servidores do executivo federal e aumenta alíquota de contribuição previdenciária de todos os servidores federais 11 para 14%.
A Dra. Marilinda Marques Fernandes, advogada especialista em Direito da Seguridade Social, falou sobre o aumento da pobreza como uma consequência direta da reforma da Previdência. “Mesmo que esta seja uma proposta desidratada em relação a primeira PEC 287, de dezembro de 2016, não irão parar, já que o Banco Mundial apresentou recentemente em relatório a necessidade do Brasil fazer novas reformas da previdência”.
Marilinda comentou sobre como a proteção social apareceu na história da sociedade ocidental, acompanhada das lutas dos trabalhadores após o êxodo rural, buscando também saúde e educação. Em 1923 foi criado o primeiro sistema de previdência no Brasil, separado para cada categoria profissional. Até 1988 servidores públicos não contribuíam para a previdência e quando se aposentavam eram pagos pelo tesouro. A divisão entre celetistas e estatutários vem a partir da Constituição Federal. Com o regime jurídico único, o servidor passou a pagar integralmente sua previdência, enquanto celetistas contribuem com 11% do montante, sendo o restante pago pelo seu empregador. De acordo com a advogada, o Estado não tem pago a sua parte para o Tesouro, integralizando aposentadoria dos servidores públicos.
Segundo Marilinda, várias categorias de servidores já pagam 14% da alíquota previdenciária e em breve todos os beneficiários também vão pagar. Para ela os cálculos dos benefícios de aposentadoria antes de 1988 eram ainda mais injustos. Com a Constituição Federal, políticas de Seguridade Social instituíram uma previdência contributiva e assistência social e saúde públicas gratuitas.
A advogada relembra que a Previdência deveria ser financiada pela folha de salários e pelas empresas, “o problema é que muitas empresas privadas não contribuem para a Previdência Social, sequer pagam impostos e o lucro gerado por essas sonegações é investido no capital financeiro especulativo. Com o trabalho flexível intermitente diminuindo o pagamento dos salários dos trabalhadores, menos contribuirão para a previdência. Assim, podemos observar que o pacote de reformas da Previdência e trabalhista e a contenção de gastos por 20 anos com serviços sociais é uma ponte para o passado, com foco na aplicação dos recursos da Previdência no capital financeiro por via da privatização parcial da mesma”.
A especialista comenta que a reforma previdenciária do governo FHC estabeleceu o fator previdenciário e consolidou perda de direitos na área dos direitos acidentários e da aposentadoria especial e retirou a paridade entre servidores contratados antes e depois de 2003, criando a previdência complementar para aqueles que recebem acima do teto do INSS.
De acordo com a advogada, estava proposto na PEC 287 original, de dezembro de 2016, que a pensão e o benefício de prestação continuada teriam rebaixado seu valor para 50% do salário de benefício, e que não poderia ser acumuladas pensão e aposentadoria, além da mudança na idade e no tempo de carência necessários para se aposentar.
A proposta atual, na prática, acaba com a aposentadoria por tempo de contribuição, instituindo aposentadoria por idade aos que tiveram 15 anos de carência, com aumento progressivo da idade para 62 e 65 anos. Porém, a proposta consiste em trabalhar 15 anos para receber 50% do salário de benefício como aposentadoria. Para obter 100% do salário de benefício deve-se trabalhar 40 anos.
A presidente Dilma, com a lei 13.135, já havia aumentado o tempo de carência para receber benefício de pensão, dificultando seu acesso e diminuindo seu valor. O presidente Temer, com a Medida Provisória 709 que realizou um pente fino aos beneficiários de aposentadoria por invalidez e auxílio-doença, deu alta para cerca de 80% dos beneficiários, “conseguindo seu intuito de aumentar o caixa da Previdência”, comenta Marilinda, lembrando que houve greves no país no início do ano que foram exitosas ao conquistarem mudanças no projeto original. Porém, a questão das delações de empresários enfraqueceram as figuras públicas e desmobilizaram a população.
Marilinda, como anarco-sindicalista, defende ardorosamente a não judicialização das lutas dos movimentos sociais, ressaltando que o judiciário é, em grande parte, integrado por juízes oriundos da classe mais favorecida economicamente, e que os três poderes não são autônomos quanto se declaram. “A luta também não se pode dar somente por temas e demandas pontuais da categoria, tendo de ser unificada às pautas mais gerais, como mais orçamento para o SUS, sistema de saúde que é uma grande vitória do Brasil do século 20, saúde universal de qualidade, que está sendo sucateado sistematicamente”.
“Em síntese, mesmo que a reforma esteja “desidratada”, o próximo presidente atenderá as demandas do capital a fim de possibilitar a entrada de novos recursos no país. O governo teve vitórias neste meio tempo, com aprovação da reforma trabalhista e a possível extinção da Justiça do Trabalho. Estas reformas, com uma população que não teve educação previdenciária e nenhuma preparação para o momento da velhice, da doença e da morte, é a receita para a miséria”.
Texto e Fotos: Carina Kunze
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