Na última terça-feira (13), no auditório do Sindisprev-rs, a especialista em direito previdenciário, Marilinda Marques Fernandes, debateu a proposta de emenda constitucional nº 287/16, que reforma da Previdência Social, expondo e discutindo com os servidores seus principais reflexos.
Para Marilinda o país passa por um processo de captura do estado social pelo capital financeiro, que atinge seu grau máximo ao privatizar a previdência pelo capital bancário e industrial. “A Previdência Social é um direito humano fundamental, garantido pela Constituição de 1988, e é importante principalmente por tratar o cidadão quando se encontra mais vulnerável. A reforma atinge toda a população brasileira, ensejando um debate que tem sido levado a cabo de modo inaceitável, com enfoque único na crise econômica, sem ter em conta todos os aspectos sociais”, afirma a advogada.
A PEC 287 acaba com a aposentadoria por tempo de contribuição e institui aposentadoria apenas por idade, sem distinção entre homens e mulheres. Para que o beneficiário tenha a integralidade do salário de benefício precisa, além de ter 65 anos de idade, de 49 anos de contribuição. Porém, afirma a advogada, em estados com baixo índice de desenvolvimento humano a expectativa de vida geral não corresponde a de todos os estados da nação, pelos dados do IBGE. “A exigência dos 49 anos de contribuição em um país de elevado grau de pobreza e desemprego, com um sistema único de saúde com recursos congelados pela PEC 55 por 20 anos, aumentará a desigualdade social”, afirma Marilinda. Para a advogada as regras de transição se pautam apenas pela idade, não tendo em conta o valor social do trabalho daqueles que começam bem mais cedo a trabalhar.
Conforme aponta Marilinda, o tratamento diferenciado para aposentadoria de homens e mulheres têm justificativas históricas que não se modificaram para a grande maioria das brasileiras, que ainda cumprem dupla jornada de trabalho e com menor inserção no mercado de trabalho, recebendo rendimentos inferiores aos dos homens. Para Marilinda muitas coisas em relação à PEC ainda poderão ser modificados, dependendo da pressão exercida pelo povo, já que a previsão é dela ser votada até ao final do próximo semestre.
As constantes mudanças das regras da aposentadoria desencadeiam uma sensação de insegurança, desestimulando a contribuição para previdência pública. Além disso, afirma a advogada, a PEC é omissa no combate a segregação fiscal, já que a dívida de pessoas físicas e jurídicas com a união chega a 1,9 trilhões de reais, sendo que, do estoque da dívida ativa, 413,3 bilhões são débitos previdenciários.
Deve-se ter em conta, de acordo com a especialista, que pela PEC 287/16 também serão modificadas as condições de acesso ao benefício de pensão por morte, bem como seu percentual e sua não acumulação com qualquer benefício de aposentadoria. No caso da aposentadoria por invalidez dos servidores, que tinham direito a 100% do salário-de-benefício, com a PEC passarão a ganhar 51% da média dos salários mais 1% por ano trabalhado como inválido.
Além disso, será instituído um regime único de previdência para todos os trabalhadores e servidores de outros regimes migrarão para o regime geral. A PEC 287 prevê regras de transição para os segurados homens com mais de 50 anos e mulheres com mais de 45 anos, com aplicação de um pedágio de 50% sobre o tempo que falta para se aposentarem pelas regras de hoje. Para a advogada a emenda é inconstitucional em diversos sentidos, inclusive pelo fato de as regras de transição das emendas constitucionais número 20 e número 41 ainda não terem terminado seu prazo.
Marilinda ressalta que quem já tem condições de se aposentar não vai perder o direito e não é preciso se precipitar, mesmo no caso de a emenda ser aprovada. Porém, quem contribui para dois ou mais regimes de previdência, se aprovada a emenda, passará a ter que optar por uma delas, em razão da previsão de impossibilidade de acumulação.
De acordo com José Campos, do sindicato, “o que se desenha é um confisco dos salários dos servidores e não apenas uma reforma na Previdência, já que esses contribuirão sem receber o mesmo em troca. Não ter pensão, por exemplo, é uma forma de confisco, além de uma série de outros mecanismos propostos para se contribuir e não receber integralmente. A pensão tem função de garantir a qualidade de vida de uma família com filhos. Mas a vida dos mais pobres é assim, tem que trabalhar mais, cada vez mais cedo, ganhando menos, sem se discutir sobre o lucro das empresas, dos bancos e latifúndios. O Estado está se apropriando dos salários, além do que, é uma reforma na Previdência com a justificativa de um deficit que não existe. Querem tornar a previdência pública menos atraente para valorizar as previdências privadas, já que ninguém acha que consegue trabalhar 588 contribuições, ou 49 anos, com carteira assinada hoje em dia. É uma apropriação indevida, quase um novo imposto, um confisco que se propõe a beneficiar o capital financeiro através da disseminação de fundos privados”.
Para José Campos “é preciso acabar com a sonegação e valorizar a pensão e aposentadoria dos trabalhadores e rever as pensões e aposentadorias dos militares. A proposta de reforma trabalhista também se relaciona com a reforma previdenciária, inclusive a questão da prevalência do negociado sobre o legislado. Estamos jogando fora 10 anos de evolução da Seguridade Social no Brasil. Há retrocessos que vão nos levar à barbárie, é preciso unificar a esquerda para reverter esse quadro”.
Por fim, Marilinda agradeceu o convite para participação no evento e terminou afirmando que é fundamental a retomada do debate da Previdência Social nos sindicatos, com autonomia e resgate de sua importância, “a Previdência Social tem de ser encarada como um direito essencial e não como um apêndice do direito trabalhista. Direitos previdenciários e direitos trabalhistas têm de caminhar juntos, mas serem estudados e entendidos como direitos de natureza distinta e de igual importância. Em razão dessa estratégia nos últimos anos se observa uma acentuada alienação dos trabalhadores em relação aos seus direitos previdenciários, enfraquecendo as lutas por uma seguridade social forte e abrangente. Mais do que nunca é preciso uma unidade de classe contra a PEC 55 e contra a PEC 287”.
Como disse Giuseppe Finco: “Bombeiros não somos, incendiários é que somos”.