Proteção à saúde do trabalhador avançou, mas ainda convive com ‘o século passado’

No mês em que as vítimas de acidentes do trabalho são lembradas, um livro com mais de 500 autores procura detalhar o assunto. O Dicionário de Saúde e Segurança do Trabalhador: Conceitos – Definições – História – Cultura”, organizado pelo médico do trabalho e professor René Mendes, membro Associação Brasileira de Saúde do Trabalhador e da Trabalhadora (Abrastt), reúne 522 autores, com perfil multiprofissional, e enfoca as principais questões das relações entre o trabalho e a saúde em 1.280 páginas com 1236 verbetes.

“Este livro partiu da percepção de que há uma carência muita grande de textos relacionados à área para um público muito além dos médicos do Trabalho”, disse o autor à revista Proteção. A obra já foi lançada em São Paulo, Campinas (SP), Rio de Janeiro, Natal, João Pessoa, Maceió, Aracaju, Salvador, Curitiba, e hoje (16) em Brasília.

Para Nilton Freitas, representante regional da Federação Internacional dos Trabalhadores da Construção e Madeira (ICM) e um dos autores, o sistema de proteção avançou, especialmente no Brasil, mas o mundo do trabalho ainda convive “com o século passado”. Essas melhorias, em boa parte, estão relacionadas a acordos em alguns setores de atividade. “O sistema normativo, com complementos aditivos, melhorou bastante. Essas normas avançaram no sistema de gestão, deixou de ser pontual. Importante dizer que foram acordos tripartite (trabalhadores, empresários e governo)”, observa.

Ele também cita a criação da Rede Nacional de Atenção Integral à Saúde do Trabalhador (Renast), no âmbito do Sistema Único de Saúde, a expansão dos Centros de Referência de Saúde do Trabalhador e, no sistema previdenciário, a figura do nexo técnico, prevendo maior punição. “Nesse conjunto de forças houve uma melhora. Pelo menos, uma mudança de perfil. Mas o velho mundo continua existindo. A OIT (Organização Internacional do Trabalho) discute o futuro do trabalho, a indústria 4.0, mas na região a gente continua convivendo com séculos passado, com condições precárias”, acrescenta.

Hoje há outros fatores que afetam a saúde do trabalho, lembra Nilton. “Antigamente, a pessoa se contaminava involuntariamente. Hoje, ela usa calmantes, tranquilizantes, a pessoa se droga. A própria manutenção do emprego é um fator (de estresse). A forma de adoecimento ou de sofrimento é mais emocional. O desemprego é uma forma de adoecimento”, observa o diretor da ICM, que já assessorou sindicatos e atuou no Ministério do Trabalho.

Para ele, a própria “reforma” trabalhista, além de enfraquecer os sindicatos, também debilita a fiscalização do trabalho. A política do atual governo também atua contra o Estado regulador de um sistema de proteção social. Com isso, o Brasil, a exemplo de outros países, caminha para “a desregulamentação, a ausência de proteção”. “É para onde estamos indo”, acrescenta.

Acidentes

De acordo com o Ministério Público do Trabalho, ocorre um acidente no país a cada 48 segundos, com uma morte a cada três horas e 38 minutos. O coordenador nacional de Defesa do Meio Ambiente do Trabalho, Leonardo Osório Mendonça, cita inclusive a morte do ativista norte-americano Martin Luther King, que completou 50 anos no último dia 4.

“Poucos sabem que o motivo que o levou até Memphis, local do seu assassinato, foi uma greve ambiental, em que empregados de limpeza urbana reclamavam melhores condições de trabalho. Eles carregavam o lixo na cabeça, o chorume escorria, mas não tinham onde tomar banho.” Ainda segundo o coordenador, mais de 90% dos acidentes poderiam ser evitados, se fossem seguidas as medidas das normas regulamentadoras do Ministério do Trabalho.

O presidente do Tribunal Superior do Trabalho (TST), ministro Brito Pereira, defende uma “mudança de hábitos” no ambiente de trabalho. “Muitas vezes, empregadores e empregados acabam ignorando o perigo gerado por uma atividade de risco. É preciso mudar essa cultura, pois, para que o acidente aconteça, basta um descuido.”

Fonte: Rede Brasil Atual

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