Por oito votos a dois, o Supremo Tribunal Federal (STF) mudou sua jurisprudência e decidiu nesta quinta-feira que prescreve em 5 (cinco) anos, e não mais em 30 (trinta), o prazo para que o empregado possa cobrar do empregador valores não depositados do FGTS. Ou seja, o trabalhador pode reclamar do que não foi pago até cinco anos antes. Caso tenha deixado a empresa, continua valendo a regra de ir à Justiça em no máximo dois anos depois do fim da relação de trabalho. A decisão tomada diz respeito a uma ação que opõe o Banco do Brasil e uma funcionária, mas tem repercussão geral, ou seja, juízes de outros tribunais ficam obrigados a tomar a mesma decisão em processos semelhantes.
O Banco do Brasil recorreu ao STF contra decisão do Tribunal Superior do Trabalho (TST), segundo a qual o prazo de prescrição para a cobrança de valores não depositados do FGTS é de 30 anos. No recurso, a instituição financeira alegou que a prescrição em 30 anos está prevista em uma lei e em um decreto de 1990. Mas destacou que, a Constituição, no artigo 7º, estabelece outra coisa: é direito do trabalhador ingressar com “ação, quanto aos créditos resultantes das relações de trabalho, com prazo prescricional de cinco anos para os trabalhadores urbanos e rurais, até o limite de dois anos após a extinção do contrato de trabalho”.
O relator, ministro Gilmar Mendes, afirmou que os trechos da lei e do decreto questionados pelo banco são inconstitucionais Ele também propôs uma modulação da decisão, ou seja, determinando que os efeitos dela passem a valer daqui para a frente. Para casos passados, o prazo vai variar de acordo com a situação. Por exemplo: se já se passaram 27 anos desde o período em que o FGTS deixou de ser depositado, o empregado poderá cobrar os valores em até três anos, completando o prazo de 30 anos. Por outro lado, se o depósito deixou de ser feito há 23 anos, o prazo se encerrará daqui a cinco anos, mesmo faltando sete para alcançar os 30 anos.
— Entendo que, no caso, o princípio da segurança jurídica recomenda que seja mitigado o princípio da nulidade da lei inconstitucional, com a consequente modulação dos efeitos da presente decisão, de modo a resguardar as legítimas expectativas dos trabalhadores brasileiros, as quais se pautavam em manifestações, até então inequívocas, do tribunal competente para dar a última palavra sobre a interpretação da Constituição (STF) e da corte responsável pela uniformização da legislação trabalhista (TST) – afirmou Gilmar Mendes.
Votaram com Gilmar Mendes os ministros Luís Roberto Barroso, Luiz Fux, Dias Toffoli, Cármen Lúcia, Celso de Mello e Ricardo Lewandowski. O ministro Marco Aurélio também entendeu que a prescrição deve ocorrer em cinco anos, mas se manifestou contrariamente à modulação.
— O prazo de 30 anos parece excessivo e desarrazoado, o que compromete, no meu ver, o princípio da segurança jurídica – disse Barroso, acrescentando: — Por fim, 30 anos é o prazo máximo para privação de liberdade no direito brasileiro. Nem mesmo crimes graves, com pena privativa de liberdade superior a 12 anos, têm prazo prescricional tão alargado. O maior prazo prescricional no Código Penal é de 20 anos, podendo ser aumento em um terço se o condenado for reincidente. A previsão de um prazo tão dilatado eterniza pretensões no tempo e estimula a litigiosidade, problema que já se tornou crônico no Brasil em prejuízo da necessária estabilização das relações jurídicas. Nenhuma dívida pecuniária deveria poder ser cobrada 30 anos depois de seu inadimplemento – disse Barroso.
Discordaram do relator os ministro Teori Zavascki e Rosa Weber. Teori entendeu que o FGTS não pode ser considerado como parte dos “créditos resultantes das relações de trabalho”, cuja cobrança é prevista no artigo 7º da Constituição. Segundo ele, trata-se de uma relação entre o próprio fundo e o empregador, sem envolver diretamente o empregado. Assim, não há restrição para o prazo de prescrição de 30 anos. Já Rosa Weber disse que, em razão do desequilíbrio de forças entre empregador e empregado, deve ser aplicada a norma mais favorável ao lado mais frágil.
Mesmo decidindo que o prazo de prescrição é de cinco anos, a proposta de modulação levou o STF a negar o recurso do Banco do Brasil. O único que votou favoravelmente ao recurso foi Marco Aurélio. A Justiça Trabalhista havia entendido que a instituição financeira deixou de depositar os valores correspondentes ao FGTS de sua funcionária entre 2001 e 2003.