“O tratamento dos litígios de massa deve ser coletivo, porque causa dano coletivo, um direito violado gera legiões de vitimas”

As ações civis públicas do Sindppd/RS e do Sindisprev/Rs ajuizadas pelo escritório Marilinda Marques Fernandes – Advogados Associados contra o Plano de Saúde dos funcionários gerido pela GEAP, em razão de aumento de 37% a 56% nos valores de contribuição, foram julgadas procedentes em primeira instância.

O juiz da 16ª Vara Civil da comarca de Porto Alegre, João Ricardo dos Santos Costa, declarou abusivo o reajuste estabelecido na resolução GEAP/CONAD n° 99/2015, orientando no sentido da desconstrução da mesma, substituindo pelo índice de reajuste de 13,55%, definido pela ANS, e condenando a ré (GEAP) a restituir os valores pagos, atualizados pelo IGP-M desde os pagamentos, mais juros de 1% ao mês a contar da citação. A sentença terá abrangência para todo território nacional.

Segundo o juiz, “o Código de Defesa do consumidor anula a cláusula que permita ao fornecedor, direta ou indiretamente, variar o preço unilateralmente. (…) No caso concreto, não há dúvidas de que o aumento excessivo no valor das mensalidades configura hipótese de variação unilateral de preço, o que inviabiliza a continuidade da relação contratual, privando o contratante do plano do uso dos serviços médicos, justamente no período da vida em que os mesmos se tornam mais necessários”. A resolução em questão “também estabeleceu o reajuste diferenciado em função da idade do beneficiário, prática vedada pelo próprio Estatuto do Idoso, Lei n° 10.741/2003.”.

Para o juiz João Ricardo, “a massificação das relações de consumo tem como característica a existência de um ator hegemônico que aparece como detentor do poder contratual e tecnológico, denominado fornecedor e, no polo oposto, o cidadão, ente submetido e fragilizado pela opressão do fenômeno consumista, a tal ponto que leva a denominação de consumidor, por isso destinatário de norma protetiva. A alta tecnologia, centralizada na mão de poucos (como dito, identificados como atores hegemônicos da economia) causa um desequilíbrio nas relações sociais que resulta numa litigiosidade endêmica, mesmo que reprimida, já que as legiões de vítimas dos abusos perfilam num quadro de insatisfação que influência na qualidade de vida. O geógrafo e filósofo Milton Santos bem percebeu o fenômeno:”

No período histórico atual, o estrutural (dito dinâmico) é, também, crítico. Isso se deve, entre outras razões, ao fato de que a era presente se caracteriza pelo uso extremado de técnica e de normas. Uso extremado das técnicas e a proeminência do pensamento técnico conduzem à necessidade obsessiva de normas. Essa pletora normativa é indispensável à eficácia da ação. Como, porém, as atividades hegemônicas tendem a uma centralização, consecutiva à concentração da economia, aumenta a inflexibilidade dos comportamentos, acarretando um mal-estar no corpo social”. (Por uma outra globalização, do pensamento único a consciência universal)

Ainda segundo o juiz, “em suma, a via individual (…) torna-se perniciosa ao tanto funcionamento do Estadojudiciário, como ao convívio social. (…) Não temos mais tempo e espaço para postergarmos uma mudança de cultura na forma de soluções dos conflitos judiciais, considerando a metamorfose observada na conflitualidade social produzida pela relação de consumo massificada. (…) Tenho que o enfrentamento individual de tais conflitos assume uma moldura autofágica, ausente de racionalidade e com visíveis sinais indicando para a falência do sistema judicial, caso continue admitindo a subversão de princípios processuais vitais ao acesso à justiça.”.

Processos n°: 001/1.16.0028917-8 (CNJ:.0045864-43.2016.8.21.0001) e nº 001/1.16.0015805-7 (CNJ 0025405-20.2016.8.21.0001)

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