Dra. Marilinda debate impactos da reforma da Previdência com funcionários do CPRM

A ASSEMPA, Associação dos Empregados da CPRM de Porto Alegre, companhia pública de pesquisa de recursos minerais ligada ao Ministério das Minas e Energia, promoveu na última quarta-feira, 3 de maio, debate sobre a Reforma da Previdência e os impactos da PEC 287 em palestra da Dra. Marilinda Marques Fernandes.

A Dra. Marilinda Marques Fernandes começa a palestra contextualizando o Brasil na situação política mundial, “país em que a valorização das commodities preservou alguns anos antes de entrar na crise internacional, mas a conjuntura já era de desaceleração da economia desde 2008, época em que começou a se aprofundar o receituário da austeridade. No Brasil, os apoiadores da reforma atual argumentam ela está sendo feita à semelhança de diversos países europeus, o que é um deboche, para um país em que, em alguns estados, a expectativa de vida é mais baixa do que 65 anos, querem que trabalhemos até morrer”. Para a advogada o presidente Temer e sua equipe estão determinados a levar a cabo as reformas trabalhista e previdenciária e tudo têm sido feito no sentido de aprová-las rapidamente e a qualquer custo.

A reforma trabalhista passou no Congresso sem resistência da população, muito pelo discurso da geração de emprego promulgado pela mídia. A mídia, e uma minoria da população por consequência, questionam, como se fossem privilégios, os salários dos servidores públicos, sem questionar os altos salários dos empresários da iniciativa privada”. Para Marilinda, “o processo do impeachment rompeu com o mínimo estabilidade do estado de direito que havia no Brasil, abrindo as portas para reformas que atacam frontalmente os direitos sociais da população e, por consequência, direitos humanos, como é o caso da emenda constitucional n° 95 e das reformas trabalhista e previdenciária. A PEC 287 pega 90% da população brasileira, por isso está havendo maior resistência. Os atuais detentores do poder reformam a CLT, acabam com a segurança no trabalho, impondo uma flexibilização de contratos, aprovando que o negociado prevaleça sobre o legislado, em uma luta de classes extremamente desigual no Brasil, na qual os sindicatos são fracos e as negociações serão desastrosas. Com a terceirização ilimitada para atividade-fim, aprovada a pouco tempo, as empresas tomadoras de serviços não terão mais responsabilidade solidária com os trabalhadores, não terão de pagar encargos trabalhistas, e agora, com a regulamentação do trabalho intermitente, o empregado poderá ser contratado por hora, sem que seja recolhida contribuição previdenciária ou para fundo de garantia. Essas ações, sabemos, não terão como resultado geração de novos empregos, apenas a precarização dos já existentes”.

Quanto a reforma previdenciária, para a advogada, “não se trata de uma reforma, mas de uma contra-reforma, já que a palavra reforma denota uma melhora de condição”. Para Marilinda a PEC 287 observa apenas as saídas de receita da Previdência, benefícios concedidos a população, mas não as entradas. “A Seguridade Social, aprovada pela Constituição Federal de 1988, coloca a Previdência Social como contributiva mas, em alguns países, como na Suíça, ela é universalizada e paga pelos impostos. No Brasil, apesar de os indivíduos terem que contribuir, a Previdência também é financiada por impostos, como o Cofins e o PIS/PASEP, além da folha de salários. O Governo Federal atual, que argumenta deficit na Previdência ao contabilizar apenas a contribuição do trabalhador, também aumentou a porcentagem de desvinculação das receitas da Seguridade para o fundo comum da União de 20 para 30%, para usá-la para pagar a dívida pública, além de ampliar a enorme desoneração de grandes empresas e não ter uma política de execução das dívidas. Em 2016 apenas 0,7% da dívida da Previdência foi executada, ou seja, não há uma vontade política de fortalecer a Previdência Social”.

Marilinda relembra que a “antiga presidente teve também uma política de desoneração de empresas para geração de emprego, o que não aconteceu, pois a elite brasileira gosta de jogar no cassino da especulação financeira e não investe na indústria nacional. Ainda por cima o país não cobra imposto sobre dividendos, nem sobre heranças, grandes fortunas, ou movimentações financeiras, como a CPMF. O desemprego endêmico do país decorre da ausência de um plano de desenvolvimento, em um mercado que está fraco neste período pós-fordista de pouca indústria e pleno emprego. Neste sentido, uma política atualizada de Seguridade Social deveria taxar os lucros das empresas e não a folha de salários. O discurso de que a Previdência é deficitária é contradito pelos próprios auditores fiscais da Previdência, afirmando que é, na verdade, superavitária. O governo não se preocupa com o que movimenta a economia do país, com esta ferramenta de distribuição de riquezas que é a Previdência Social, com a fome da população, nem com o poder de compra do trabalhador, penalizando o segurado reduzindo a concessão de benefícios”.

A advogada relembra que “logo após o impeachment da presidente Dilma houve a instalação da MP 739, que fez um pente-fino de revisão dos auxílios-doença e aposentadorias por invalidez, em que, a cada 10 perícias realizadas, 9 beneficiários recebem alta, ou seja, o governo trata a população como se fossem enganadores, e essa medida gerou uma maior judicialização das solicitações de benefícios sociais, uma questão de direito dos contribuintes. Esse governo acabou com o Ministério da Previdência Social, colocando-o no Ministério da Fazenda, como se fosse apenas uma peça do orçamento da União, colocando o INSS dentro do Ministério do Desenvolvimento Social, sem a mínima preocupação de levar a cabo uma verdadeira política social”.

A presidente Dilma já havia reformado a Previdência ao promulgar a Lei 11.135, de 2015, que aumentou o tempo de carência necessário para solicitar o benefício de auxílio maternidade e modificou a pensão, que deixou de ser vitalícia (só a partir dos 44 anos) e passou a ser apenas para cônjuges juntos há mais de dois anos. No natal de 2016 o atual governo apresentou a PEC 287, quer define que o trabalhador só poderá se aposentar no Brasil com mais de 65 anos de idade e no mínimo 25 anos de contribuição, igualando homens e mulheres, do campo da cidade, desconsiderando a dupla jornada de trabalho e a função social da maternidade. Para Marcelo Caetano, secretário da Previdência Social, as mulheres ganham o mesmo que os homens, e estes ajudam em casa. Só a palavra ajudar já demonstra de quem é a responsabilidade social deste cuidado familiar. A sociedade perpetua estereótipos de gênero e não estaremos, em curto ou médio prazo, desoneradas das atividades domésticas. A igualdade parte, por exemplo, de uma divisão igualitária da licença maternidade para homens e mulheres, igualando as mulheres no mercado de trabalho, inclusive em salários”.

A pressão contra a reforma está sendo feita pela população. Os deputados, principalmente os que foram eleitos pela população do campo, geraram diversas emendas à PEC 287. Uma delas colocando a aposentadoria das mulheres não aos 65, mas aos 62 anos, e a da população do campo, para homens, aos 60 anos, e mulheres a 58 anos. Porém a PEC permanece com um dispositivo de aumento da idade mínima necessária para aposentadoria conforme houver aumento da expectativa de vida da população. Essa medida acaba, praticamente, com aposentadoria por tempo de serviço. As mulheres no Brasil não conseguem pagar nem os 15 anos hoje necessários. Mulheres têm salários mais baixos, no Brasil não há creches suficientes para que possam ter condições de regresso ao trabalho”. Para a advogada, “em pouco tempo teremos um grande contingente de excluídos e nós mulheres seremos a maioria, principalmente as mulheres do campo, muito afetadas pela necessidade de pagamento individual mensal da Previdência Social. A exclusão da proteção social da Previdência da população do campo vai deixar de distribuir renda e dinamizar a economia das comunidades do interior, o que gerará um novo êxodo para os centros urbanos, aumentando a desigualdade social”.

Funcionários de empresas públicas, com a reforma, não poderão continuar trabalhando após aposentarem-se. Também não será mais possível acumular os benefícios de pensão e aposentadoria se a soma dos valores exceder dois salários mínimos, “o que é algo extremamente injusto, dado que as pessoas assinam um contrato e pagam por um serviço que muda as regras no meio do caminho, confiscando valores”. Não poderá ser acumulada aposentadoria de regimes distintos. “Pela pressão social feita pela categoria dos professores, esta será uma exceção à regra”. A aposentadoria especial para atividade de risco, mesmo que comprovado com PPP, foi dificultada, aumentando a idade para solicitação, assim como a aposentadoria para deficientes, regulamentada pela Lei 142 de 2013. Haverá também uma mudança no cálculo do salário-de-benefício, dantes calculado em uma média feita com base nos 80% melhores salário do indivíduo desde julho de 1994, agora será calculado com base em todos os salários da vida contributiva do trabalhador, “rebaixando o benefício daqueles cujo histórico consta, por exemplo, início de carreira em empregos de menor rendimento, e elevando o valor do benefício daqueles que puderam ter melhor qualificação e iniciaram a carreira recebendo mais”.

Ainda de acordo com a PEC 287, originalmente a pensão e o benefício de prestação continuada seriam desvinculados do salário mínimo, “mas o governo voltou atrás, houve pressão popular e os deputados precisam manter seus votos e ter foro privilegiado em meio há tantos escândalos de corrupção”. Mesmo vinculada ao salário mínimo, a pensão não será de 100% do salário-de-benefício, mas de 50% do valor, mais 10% por dependente, e o BPC será apenas para maior de 68 anos, “idade extremamente avançada para pessoas pobres, com necessidades, sem condições e com expectativa de vida baixa”. Também de acordo com a PEC será necessário 40 anos de contribuição para se obter 100% do salário de benefício, “sendo que não foi feito um estudo técnico que explique esse valor, essa quantidade de tempo. O cálculo primeiro era de 49 anos, agora é 40, ou seja, é uma loteria, uma questão de pressão social, estão jogando conosco. E se reformarmos demais a PEC original com muitas emendas que a descaracterize, logo adiante farão outra reforma. A Previdência teve diversas reformas, com emendas no governo FHC, Lula e Dilma essa PEC é a quarta emenda constitucional que se faz na área da Previdência Social desde 1988”.

Por fim, a palestrante convoca a todos “a ajudar a barrar a reforma da Previdência. Temos que pressionar os deputados para que não alcancem os 308 votos necessários para aprovação da PEC. Este é um projeto do governo voltado para o empresariado, principalmente da área da previdência privada. Dificilmente se recuperam direitos sociais adquiridos após serem perdidos. Podemos tentar pedir reversão em ações civis públicas, sob o argumento do princípio constitucional de que não se pode haver retrocesso em matéria de direito social, mas é bastante difícil. Se forem feitas reformas pelos estados e municípios, talvez sejam ainda mais pesadas, sendo que todos os entes federados deverão se adequar à lei superior da Constituição Federal. Por isso, é necessário nos organizar e combater a reforma, unidos enquanto classe, resgatando o princípio de solidariedade no país, pois a fragmentação dos trabalhadores torna fácil para as elites tirarem nossos direitos”.

Texto e fotos: Carina Kunze

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