O trabalho doméstico no Brasil ganhou novo reforço. Entrou em vigor em 7/8 a lei que prevê multa para o empregador que não assinar a carteira de trabalho do empregado doméstico. A punição pode chegar ao dobro da aplicada a uma empresa privada no campo ou na cidade, que hoje é de R$ 402,53.
Segundo dados da Pesquisa Nacional por Domicílios (Pnad) do IBGE, realizada em 2012, apenas um terço dos trabalhadores domésticos no Brasil possuem carteira assinada. Dentro da legislação brasileira, para ser qualificado como empregado doméstico o trabalhador deve prestar serviços durante três ou mais dias na casa do empregador.
Desde o ano passado, leis modificadas e aprovadas estão igualando os direitos dos trabalhadores domésticos aos direitos das profissões já regulamentadas.
“Essa lei [que prevê a multa em caso de falta de registro] quebra a cultura patriarcal”, opina Mario Avelino, da ONG Doméstica Legal, instituição que propôs a lei e que fornece serviços de consultoria às domésticas e aos empregadores. “Agora, o patrão doméstico, assim como uma empresa que não cumpre a lei, vai ser punido com multa pecuniária.”
A pesquisadora Noêmia Garcia Porto, da Faculdade de Direito da Universidade de Brasília, diz que o Brasil demorou quase três décadas para começar a alterar a legislação do trabalho doméstico. “É muito recente no Brasil essa perspectiva de que o trabalho doméstico é um trabalho profissional e é assim que esse profissional tem que ser visto”. A professora acredita que as novas leis possuem poder para impulsionar o debate a respeito do tema.
Fiscalização
A aplicação das multas para os empregadores que não assinarem a carteira dos empregados domésticos será mediada pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), que publicou na quarta-feira (06/08) as regras para a fiscalização. Como o ambiente de trabalho é o lar, que segundo a Constituição é inviolável, a entrada de um fiscal só pode ocorrer com a permissão do morador ou com ordem judicial.
Para fazer a denúncia anônima, o empregado em situação irregular poderá procurar uma delegacia regional do trabalho e caberá ao auditor notificar o empregador e solicitar a regularização. Caso a regularização não seja feita, será aberto o procedimento para aplicação da multa.
Na opinião de Noêmia Garcia Porto, dificilmente um empregado fará a denúncia enquanto estiver exercendo a atividade pois terá medo de uma retaliação, ainda que tais denúncias sejam anônimas. “É muito difícil impedir que haja, no futuro, uma demissão em razão da denúncia”, avalia a pesquisadora.
Na visão de Mario Avelino, a multa para situações irregulares deve ser vista como um estímulo à formalidade. “Nossa expectativa é que, só neste mês de agosto, consigamos formalizar de 230 mil a 250 mil domésticas.”
Adequação legal
Alguns direitos, entretanto, ainda não estão regulamentados, como o pagamento do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS), indenização por demissão sem justa causa e auxílio-creche.
A Organização Internacional do Trabalho reconhece, em relatório sobre o tema, o avanço do Brasil na regulamentação do trabalho doméstico, mas cobra mais instrumentos de fiscalização. Em vigor desde abril do ano passado, a chamada PEC das Domésticas promoveu mudanças na regulação desse tipo de trabalho, especialmente na definição de jornada semanal máxima de 44 horas e no pagamento de horas extras.
“Quando a PEC foi promulgada, a gente quebrou a espinha da cultura escravagista”, diz Avelino, que defende, ainda, a aprovação de outras leis que irão simplificar as relações de trabalho e motivar o empregador a regularizar a situação dos funcionários.
Uma lei, porém, não é garantia de mudança cultural. “A cultura que se estabeleceu é ter certo acoplamento do trabalho doméstico à servidão ou à benesse”, diz Noêmia Garcia Porto. “O trabalhador doméstico não é serviçal. Ele é um profissional e, em razão disso, a ele são devidos todos os direitos dos demais trabalhadores que estão no mercado”, conclui.
Fonte: Deustche Welle/DMT