O governador José Ivo Sartori, depois de ter anunciado, com certa antecedência, que apresentaria um pacote de medidas, segundo sua opinião e de seu governo, visando sanear o “estado de calamidade” em que se encontra o Rio Grande do Sul, encaminhou, então, na semana passada, as mesmas.
Como era de se esperar, gestadas dentro de uma política neoliberal e de contenção fiscal, que penaliza de forma severa os servidores públicos e demais entes ligados às políticas públicas, as medidas propõem a extinção das principais fundações gaúchas, com implicações gravíssimas no desenvolvimento tecnológico, como o caso da CIENTEC, na área de pesquisa e formulação de políticas estratégicas, como no caso da FEE, isto para não falarmos no empobrecimento cultural por via da extinção da Fundação Piratini.
Ademais, o pacote aprofunda a visão estratégica de um estado mínimo ao apresentar um modelo previdenciário e de relações trabalhistas que não visa uma política de fortalecimento do servidor público, com objetivo manifesto de esvaziar o serviço público de sua função primordial de levar a cabo políticas de igualdade, inclusão e universalidade, aprofundando, assim, a desigualdade.
As medidas de Sartori são um exemplo acabado da racionalidade neoliberal, tão própria dos tempos que se vive hoje no Brasil, em que o direito público se dilui em beneficio do direito privado, conformando a ação pública aos critérios da rentabilidade e produtividade, transformando o cidadão em mero consumidor.
Não podemos deixar de refletir sobre uma administração pública que adquire um caráter meramente técnico, em detrimento das considerações políticas e sociais. “A concepção dos bens públicos, assim como os princípios da sua concepção, são profundamente afetadas” e, mais adiante, vale dizer, “O cinismo, a mentira, o menosprezo, a aversão à arte e à cultura, o desleixo da linguagem e dos modos, a ignorância, a arrogância do dinheiro e a brutalidade da dominação valem como títulos para governar em nome apenas da “eficácia”.”.
(Dardot e Laval. A nova razão do mundo: ensaio sobre a sociedade neoliberal.)
Em particular, cabe destacar que as propostas do pacote que afetam de uma maneira direta os direitos previdenciários e trabalhistas passam pela eliminação da remuneração dos servidores que não estão desempenhando as funções para as quais foram nomeados por estarem cedidos a entidades de classe.
Outra proposta é o aumento da contribuição previdenciária de 13,25% para 14%. A nova alíquota vale para todos os servidores vinculados ao Regime Próprio de Previdência Social (RPPS), civis e militares, de todos os poderes. O pacote inclui também a limitação ao teto do funcionalismo. Pela regra proposta, o IPE deverá pagar a pensão, somada a vencimentos ou aposentadoria, respeitando o teto do funcionalismo previsto na Constituição Estadual, atualmente fixado em R$ 30.471,11.
Os servidores da Segurança Pública serão atingidos com várias medidas. Uma delas prevê aumentar a permanência de policiais no serviço público. Hoje, a cada cinco anos trabalhados, os militares têm direito a três meses de afastamento do serviço, a exemplo da licença-prêmio dos civis. Se não gozar, pode duplicar esse período sucessivamente, averbando para sua aposentadoria. Pela proposta do governo, essa licença especial é transformada em licença-capacitação de três meses, sem possibilidade de acumular ou dobrar períodos. Assim, fica eliminada a contagem de tempo fixo para fins de aposentadoria. Ficam respeitados os períodos já acumulados. Na prática, a partir de agora, o militar cumprirá todo o período de 30 anos de efetivo serviço para passar à reserva. Isso resulta, em média, em três anos a mais na prestação de serviço por militar.
Diante das medidas propostas, nossa resposta só pode ser a defesa intransigente dos direitos construídos por décadas de lutas. Resistir é único caminho possível em nome de um processo civilizatório do qual somos sujeitos em ação.
AO PACOTE DE SARTORI SÓ NOS RESTA A DEFESA DE UMA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA COMPROMETIDA COM POLÍTICAS SOCIAIS.
SIM A UM ESTADO POLÍTICO, NÃO UM ESTADO GERENTE!
Marilinda Marques Fernandes