Jornada mais curta não reduziu horas trabalhadas na França

Muitos classificariam a França – país em que as pessoas trabalham 35 horas por semana, fazem longas pausas para o almoço e tiram férias extensas – como parte do “sul preguiçoso”. Mas quem já teve um emprego na França sabe que a realidade é bastante diferente.

Olivier (ele pede que seu sobrenome seja omitido) é consultor de uma multinacional francesa da construção civil em Paris. Ele conta uma realidade bastante diferente do senso comum: “Eu trabalho cerca de 45 a 50 horas por semana, das nove da manhã às 19h30”.

Mas e as 35 horas por semanas? São exceção ou mito?

A economista francesa Jean-Marie Perbost diz que o “francês que trabalha pouco” é um estereótipo grosseiro. Na maior parte dos casos, a legislação de 35 horas por semana apenas garante que os trabalhadores recebam hora-extra. A realidade é que muitos trabalham por muito mais horas do que o estabelecido pela lei.

No setor de administração, a jornada de trabalho sequer é contada. Como nos Estados Unidos, o dia de trabalho dura o tempo necessário para se cumprir as tarefas. Se os funcionários trabalham por muito tempo, a empresa distribui algumas folgas ou paga horas extras.

Segundo estatísticas oficiais, 50% dos trabalhadores franceses receberam horas extras em 2010. O percentual cresceu um pouco nos últimos anos.

Não é apenas a França que sofre com estereótipos. Na Espanha – o país da siesta -, Pablo Martinez, diretor de vendas de uma multinacional alemã em Madri, diz trabalhar das 8h às 18h30.

“As coisas mudaram na Espanha para que o país conseguisse acompanhar os mercados internacionais. Não é incomum para as pessoas hoje em dia comerem seus almoços em frente ao computador, o que raramente acontecia há 20 anos, quando eu comecei a trabalhar”, conta Martinez.

Meio período

Outro fator que confunde as ideias sobre jornada de trabalho em países europeus é o crescimento do número de pessoas empregadas em meio período. Essa tendência está em alta nos últimos 15 anos e se acentuou com a crise econômica de 2008.

“O que países com baixo desemprego, como Holanda, Grã-Bretanha, Suécia e Alemanha fizeram, na verdade, foi colocar um trabalhador em cada quatro numa situação de meio período”, diz Perbost, que fez um estudo sobre o assunto para a entidade European Green Foundation.

Curiosamente, por causa da alta predominância dessa modalidade de trabalho no norte da Europa, a região hoje registra uma baixa média de horas trabalhadas por pessoa por semana.

Segundo dados do escritório europeu de estatísticas, Eurostat, em 2012 os trabalhadores em países como Holanda, Dinamarca, Suécia e Alemanha cumpriram em média 35 horas por semana – muito por conta dos contratos de meia jornada.

Já no “sul preguiçoso”, como Grécia, Espanha e Portugal, onde há mais empregos em caráter integral, a média de horas trabalhadas por empregado fica próxima a 38 horas por semana.

No caso da França, quando são levados em conta apenas os funcionários de empregos de meio turno, os trabalhadores superam o norte da Europa. Em média, cada empregado em meio turno na França trabalha 23,3 horas por semana – contra 20,1 no norte da Europa. Os dados são do grupo Dares, um braço de pesquisas do ministério do Trabalho francês.

A verdade é que legislações como a francesa, com jornadas menores de trabalho semanal, podem influenciar a renda e os direitos dos trabalhadores, mas não ajuda necessariamente a reduzir a quantidade de horas trabalhadas.

Para Martinez, esse mito de um “sul preguiçoso” é curioso. “Sempre que eu telefono para a matriz na Alemanha às 16h30, fico surpreso de descobrir que a maioria das pessoas já foi embora. Talvez estejamos trabalhando demais aqui na Espanha.”

Horas anuais trabalhadas pelo mundo

Média de 2011:
Cingapura: 2.287 horas
Coreia do Sul: 2.193 horas
Brasil: 1.841 horas
Canadá: 1.708 horas
Japão: 1.706 horas
EUA: 1.704 horas
Espanha: 1.685 horas
Reino Unido: 1.650 horas
França: 1.476 horas
Noruega: 1.421 horas
Alemanha: 1.406 horas
Fonte: Federal Reserve Economic Data

Fonte: BBC Brasil

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